ARTÍCULO ORIGINAL
Conhecimento sobre HIV/aids e a utilização do preservativo entre os participantes do carnaval
El conocimiento sobre el VIH/sida y el uso del condón entre los participantes del carnaval
Knowledge about HIV/aids and condom use among participants in the carnival
Enf. Márcio Tadeu Ribeiro FranciscoI; Enf. Vinícius Rodrigues Fernandes da FonteII; Enf. Thelma SpindolaI; Prof. Elizabeth Rose Costa MartinsI; Cristiane Maria Amorim CostaI; Enf. Carina D’Onofrio Prince PinheiroI
I Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Brasil.
II Hospital Universitário
Pedro Ernesto. São Paulo, Brasil.
RESUMO
Introducción: o HIV/aids persiste
como um importante problema de saúde pública. Durante o carnaval,
evento marcado por forte apelo à sensualidade, atrativos para realização
de práticas sexuais são comuns.
Objetivos: caracterizar o público
participante do carnaval, identificando seus conhecimentos frente ao HIV/Aids
e a utilização do preservativo.
Métodos: trata-se de uma pesquisa
transversal, realizada em março de 2011, no sambódromo do Rio de Janeiro,
Brasil. Fizeram parte do estudo expectadores, foliões e trabalhadores dos
desfiles carnavalescos, com idade de 18 anos ou mais, num total de 630 participantes
selecionados aleatoriamente, que responderam a uma entrevista estruturada, nas
arquibancadas e áreas de concentração das escolas de samba. Os
dados foram posteriormente tabulados e organizados com auxílio do software
Sphynx.
Resultados: a maioria são mulheres
(55,7 %), vivem com companheiro (52,3 %) e possuem nível médio de
escolaridade (54,8 %). Quanto ao conhecimento sobre os modos de transmissão
do vírus, os participantes informaram: relações sexuais (anal
e vaginal sem preservativo) (96,7 %), sangue (91,3 %), relação sexual
oral sem preservativo (74,1 %), de mãe para filho durante o parto (64,9
%), pelo leite materno (50,6 %), assentos de vaso sanitário (21,6 %), beijo
na boca (20 %) e insetos (17,6 %). Quanto ao uso do preservativo com parceiros
estáveis, 35,4 % usam sempre e 35,7 % nunca utilizam, com parceiros casuais
66,8 % usam sempre.
Conclusões: ainda persiste
no conhecimento popular a desinformação acerca do HIV/aids, o que
pode acarretar vulnerabilidade à infecção e o preconceito. Medidas
de educação em saúde tornam-se necessárias para o esclarecimento
das pessoas e prevenção de agravos.
Palavras chave: HIV; aids; promoção da saúde; prevenção de doenças.
RESUMEN
Introducción: el HIV/sida persiste
como un importante problema de salud pública. Durante el carnaval, evento
marcado por una fuerte sensualidad, los atractivos para realización de
práticas sexuales son comunes.
Objetivo: caracterizar al público
participante del carnaval, identificando sus conocimientos sobre el VIH/Sida
y el uso del condón.
Métodos: estudio transversal,
realizado en marzo de 2011, en el Sambódromo de Río de Janeiro, Brasil.
Los participantes fueron espectadores, juerguistas y trabajadores de los desfiles
de carnaval, de 18 años o más, en un total de 630 participantes que
fueron seleccionados al azar en las gradas y zonas de concentración de
las escuelas de samba, que respondieron a una entrevista estructurada. Los datos
se tabularon y se organizaron con la ayuda de lo software Sphynx.
Resultados: la mayoría de los
sujetos fueron mujeres (55,7 %), que vivían en pareja (52,3 %) y tenían
un diploma de secundaria (54,8 %). En cuanto a los conocimientos sobre las formas
y medios de transmisión del virus, se obtuvieron los siguientes resultados:
el coito (sexo anal y vaginal sin preservativo) (96,7 %), sangre (91,3 %), sexo
oral sin condón (74,1 %), de madre a hijo durante el parto (64,9 %), la
leche materna (50,6 %), asientos de baños (21,6 %), besos en la boca (20
%), e insectos (17,6 %). En cuanto al uso del condón con parejas estables,
35,4 % siempre usan y 35,7 % nunca usan; con parejas ocasionales, el 66,8 %
utiliza siempre.
Conclusiones: aún persiste
la desinformación sobre el VIH/sida en el conocimiento popular, lo que
puede resultar en la vulnerabilidad a la infección y el prejuicio. Se hacen
necesarias medidas de educación para la salud para aclarar las personas
y prevención de daños.
Palabras clave: VIH; Sida; Promoción de la Salud; Prevención de Enfermedades.
ABSTRACT
Objective: of the study is to characterize
the carnival public, identifying their knowledge in front to HIV/Aids and condom
use.
Methods: It is a cross-sectional
survey, conducted in March 2011, in the Sambodromo of Rio de Janeiro, Brazil.
Participants were spectators, partygoers and carnival parade workers aged 18
years or more, in a total of 630 randomly selected participants in the stands
and areas of concentration of the samba schools that responded to a structured
interview. Data were tabulated and organized with the help of software Sphynx.
Results: most subjects are women
(55.7 %), living with a partner (52.3 %) and who have a high school degree (54.8
%). Regarding knowledge about the ways and means of transmission of the virus,
we obtained the following results: Sexual intercourse (anal and vaginal sex
without a condom) (96.7 %), blood (91.3 %), oral sex without a condom (74, 1
%), from mother to child during childbirth (64.9 %), the breast milk (50.6 %),
toilet seats (21.6 %), kissing on the mouth (20 %) and insects (17.6 %). Regarding
condom use with steady partners, 35.4 % and 35.7 % always use never use, and
casual partners, 66.8 % always use.
Conclusions: the study indicates
that the adoption of actions for health education and enlightenment the public
about HIV/AIDS, are important tools that assist in health care and disease prevention.
Key words: HIV; Aids; Health Promotion; Disease Prevention.
INTRODUÇÃO
O objeto deste estudo é o conhecimento acerca da infecção pelo vírus da imunodeficiência adquirida (HIV) e a prática de utilização do preservativo entre os participantes do carnaval do Rio de Janeiro, Brasil.
O HIV, em suas três décadas de epidemia, ainda representa um obstáculo à saúde mundial e brasileira, devido a seu caráter pandêmico e as extensões dos danos causados às populações. Trata-se de um retrovírus da subfamília letiviridae, com tropismo pelas células de defesa do organismo, mais especificamente os linfócitos TCD4+. Sua replicação causa a destruição dos linfócitos e provoca um quadro de imunodepressão, levando ao desenvolvimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids).1
Sua transmissão ocorre pelas vias sexual, sanguínea e vertical. Inicialmente a epidemia esteve associada a “grupos de risco”, remetendo a essas populações situações de estigmatização e preconceito, enquanto a população em geral desfrutava da sensação de imunidade à infecção. Atualmente, utilizamos o termo vulnerabilidade para definir os múltiplos fatores, tanto individuais, sociais e programáticas, capazes de determinar a suscetibilidade de indivíduos e grupos à infecção.2
Dados nacionais apontam que vivenciamos uma epidemia estável e concentrada em alguns subgrupos populacionais (usuários de drogas injetáveis, mulheres profissionais do sexo e homens que fazem sexo com homens), dado esse questionável, afinal são
608 230 casos de Aids acumulados desde 1980, com uma média aproximada de 34 mil novos casos e 11 mil óbitos por ano. A razão entre sexos, que em 1985 era de 26 homens para um caso em mulher, em 2010 trata-se de 1,7 casos em homens para cada caso em mulher. Os jovens vêm apresentando tendência de aumento na prevalência de infecção e, entre os anos de 2000 a 2004 houve uma inversão da razão de sexo nesta faixa etária, com 0,9 casos em homens para cada caso em mulheres. Quanto ao Estado do Rio de Janeiro, os dados indicam que a taxa de incidência e o coeficiente de mortalidade encontram-se acima da média nacional.3
O Município do Rio de Janeiro conta com o empenho de diversas instituições, Organizações Não Governamentais e representantes da sociedade civil na luta contra novas infecções pelo HIV/Aids e pela garantia dos direitos, acesso e tratamentos aos portadores do vírus. No carnaval temos a contribuição do projeto “Só a alegria vai Contagiar! O samba da prevenção vai pegar neste carnaval!”, que atua junto à população vinculada ao mundo do samba nos seus diversos cenários.
O Carnaval é marcado por um forte apelo à sensualidade, seus aspectos históricos e antropológicos remetem a festa profana, da carne, onde despimo-nos dos padrões impostos pela sociedade e vestimos nossas próprias fantasias. No Rio de Janeiro, essas características tornam-se mais evidentes, pois o ritmo dançante das músicas, aliado as roupas leves do verão e consumo de bebidas alcoólicas, promovem um atrativo para práticas sexuais. O desfile das escolas de samba, no sambódromo, é um dos principais eventos da cidade, atraindo um grande número de turistas nacionais e internacionais. A maioria das escolas de samba surgiu e se encontram em bairros que vivenciam, em sua maioria, situações de risco social, com limitado acesso à educação e saúde.4
Com base no problema que a infecção pelo HIV/Aids representa para a saúde pública brasileira e as características históricas das festas carnavalescas, questiona-se: Qual o conhecimento sobre HIV/Aids e a prática da utilização do preservativo entre as pessoas participantes do carnaval?
Para dar conta do referido problema delineamos como objetivo: Caracterizar o público participante do carnaval, identificando seus conhecimentos sobre HIV/Aids e a utilização do preservativo durante as relações sexuais.
O combate à infecção exige constantes avaliações das políticas públicas de saúde e formulação de respostas mais eficazes, em um campo onde ainda não existem métodos curativos. As estratégias preventivas, através da educação em saúde, buscam garantir aos indivíduos os conhecimentos necessários para que compreendam, aceitem e assumam as medidas propostas em sua vida pessoal. Um projeto continuado de sensibilização para promoção da saúde como este se torna estratégico, devido ao aumento do efeito multiplicador e disseminador das informações nas comunidades de origem.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo transversal, proveniente do projeto de extensão intitulado “Só a alegria vai contagiar neste carnaval”, realizado durante o carnaval do Município do Rio de Janeiro - Brasil, nos desfiles das escolas de samba na Passarela do Samba Professor Darcy Ribeiro, popularmente conhecida como Sambódromo. Trata-se de um dos maiores eventos do mundo, sendo estimado um público de mais de 400 mil pessoas, entre foliões, expectadores e trabalhadores, durante os dias festivos.
A população alvo da pesquisa foi constituída pelos frequentadores do Sambódromo, durantes os desfiles das Escolas de Samba do Grupo Especial e de Acesso, em março de 2011, com idade igual ou superior a 18 anos e que tenham iniciado a vida sexual. Selecionou-se uma amostra aleatória simples de 630 participantes, abordados nas áreas de circulação dos setores pares e ímpares, nas arquibancadas 01, 12 e 13 (setores populares) e nas concentrações “balança mas não cai” e “correios”.
Os locais estabelecidos para coleta de dados no sambódromo buscou facilitar o envolvimento dos entrevistados, tendo em vista que o campo da pesquisa ocorre em ambiente festivo. A pesquisa iniciava às 17h, hora em que se abrem os portões de acesso às arquibancadas e se encerrava às 21h, hora que iniciavam os desfiles das Escolas de Samba. A abordagem nos setores populares é mais fácil, por se tratar de setores maiores e aonde as pessoas chegam mais cedo para disputar um bom lugar. As concentrações são os espaços onde as escolas se preparam para iniciar o desfile, e as ações dos agentes de pesquisa nesse local visavam absorver os foliões para compor o estudo. As áreas de circulação dos setores ímpares e pares são os espaços que antecedem a entrada nas arquibancadas, camarotes e frisas, tendo um grande movimento de trabalhadores que atuam para garantir o primor do espetáculo.
Para compor o estudo foram empregadas variáveis relacionadas às características sociodemográficas, conhecimentos sobre as formas de transmissão e prevenção ao HIV e comportamento sexual. O primeiro instrumento de pesquisa utilizado no projeto de extensão “Só a alegria vai contagiar neste carnaval”, data de 1991. Com o passar dos anos mudanças importantes aconteceram no rumo da epidemia, sendo necessários novos instrumentos para avaliar o nível de conhecimento dos entrevistados. No ano de 2004, com orientação do coordenador executivo do projeto, foi defendida pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro a dissertação de mestrado: “Representação do HIV/AIDS entre os trabalhadores do carnaval no sambódromo: Implicações para a prevenção da doença.”5 O instrumento utilizado para a construção desta dissertação serviu como modelo para os anos subsequentes. Contudo, alguns fatores propiciaram mudanças no questionário. Tratando-se de um ambiente festivo, onde as pessoas estão ali para se divertir, um instrumento longo implicava na não participação das pessoas e na fidedignidade dos dados. Portanto, ao longo desse tempo o questionário foi sendo reduzido e elaborado com perguntas fechadas.
A coleta de dados ocorreu pela aplicação de um formulário estruturado, com emprego da técnica de entrevista individual. Os dados foram tabulados e organizados, sendo aplicada a estatística descritiva, e o recurso do programa Sphynx.
O projeto observa os princípios éticos da pesquisa em saúde, envolvendo seres humanos, conforme a Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde – Ministério da Saúde, Brasil.6 Foi previamente avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Veiga de Almeida, com o número 270/11. A participação dos sujeitos no estudo ocorreu após informações sobre o objetivo do estudo, os procedimentos da pesquisa e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
As mulheres mostraram-se mais receptivas perfazendo o sexo predominante no estudo. Quanto à faixa etária, a maioria, é de adultos jovens, ou seja, pessoas que nasceram antes e durante a epidemia. Dessa forma, o início da vida sexual ocorreu durante um período de transição cultural e sexual, decorrente de respostas de prevenção e controle ao agravo. A maioria vive em relacionamentos estáveis e possuem bom nível educacional, com mais de oito anos de estudos. (Tabela 1)
Quanto ao conhecimento de meios e modos de infecção pelo HIV, a maioria dos entrevistados reconhece que o sangue, práticas/fluidos sexuais e o uso de agulhas e instrumentos perfuro-cortantes são riscos potenciais de contaminação. Contudo o conhecimento sobre transmissão vertical provoca dúvidas aos entrevistados e informações incoerentes como, saliva, insetos e beijo na boca, ainda permeiam o conhecimento popular. Com relação à pessoa de aparência saudável estar infectada com o HIV 594 (94,3 %) dos entrevistados concordam com a afirmativa. (Tabela 2)
Quanto à periodicidade do uso do preservativo, predomina-se maior utilização nas relações casuais. Com o advento da Aids, o uso do preservativo tornou-se comum nas relações sexuais. O fato de estarem em relacionamentos estáveis, ou seja, que de certo modo há uma confiança pode diminuir a opção pelo uso da camisinha. O quantitativo expressivo de sujeitos que não responderam sobre a utilização do preservativo com parceiros casuais pode estar relacionado ao fato de não possuírem esse tipo de parceria. Questionados quanto às formas de prevenção ao HIV/Aids, a camisinha foi o recurso mais citado, por 587 (93,2 %) dos entrevistados.
Dentre os meios de comunicação para aquisição de conhecimentos observa-se que a mídia foi a opção mais citada, provavelmente devido sua abrangência. (Tabela 4)
DISCUSSÃO
Aspectos sociais
A predominância de entrevistadas do sexo feminino pode ser explicada pela maior receptividade das mulheres em participar do estudo. Alguns homens recusavam colaborar com a pesquisa, mesmo sendo sensibilizados quanto à importância de sua participação. Esse dado pode ser analisado pelas questões de gênero, onde o homem se julga um ser invulnerável, não reconhecendo a doença como algo inerente à sua condição biológica, o que contribui para uma menor atenção com o cuidado de sua saúde e aumenta sua vulnerabilidade às situações de risco.7
Apesar do crescente aumento das infecções em mulheres, caminhando para uma equiparação na razão entre sexos no Brasil, o sexo masculino permanece como o mais acometido pelo vírus.3 Respostas ineficientes e equivocadas diante dos primeiros anos da epidemia culminaram com a construção de comportamentos socioculturais, que viriam a determinar o rumo da epidemia atual. O uso da terminologia de “grupo de risco” para abarcar os primeiros infectados, homossexuais masculinos, conduziu a respostas morais, associando-os a promíscuos, imorais e transgressores de normas sociais. Essa atitude suscitou a crença da imunidade ao restante da população, principalmente aos que mantinham relações heterossexuais.8
Com relação à categoria de exposição ao vírus em mulheres, predomina a transmissão por via sexual heterossexual, levando-nos a refletir sobre a participação do ser homem na cadeia epidemiológica.3 A masculinidade proveniente da construção de gênero conduz um empecilho ao cuidado com a saúde, caracterizado pelos aspectos: de força, poder sobre os mais fracos, potência, invulnerabilidade e virilidade. Essas características promovem situações hierárquicas e opressoras de gênero frente ao sexo feminino.9 Vale destacar, também que, no Brasil, apenas os preservativos masculinos são disponibilizados gratuitamente e em larga escala, dificultando o empoderamento das mulheres na construção de uma sociedade equânime.
Em relação à idade, predomina a população de adultos jovens. Nesta faixa etária foram notificados, apenas em 2010, 18 785 (54,9 %) novos casos da infecção no Brasil.3 Ademais, a maioria dos participantes do estudo nasceu antes da descoberta do vírus e/ou, no período onde a falta de conhecimento sobre suas formas de transmissão povoavam a sociedade de concepções estigmatizantes e discriminatórias à epidemia.
O nível de escolaridade da maioria dos participantes do estudo é o ensino médio completo. As escolas e universidades são importantes veículos de difusão do conhecimento, tende-se a esperar que quanto maior é a capacidade de compreensão da população sobre os fenômenos relacionados à sua saúde, melhor será sua qualidade de vida.10
Dados do inquérito nacional, realizado pelo Ministério da Saúde – Brasil, sinalizam que a população em geral possui bom nível de conhecimento sobre as formas de infecção e prevenção ao HIV. Contudo, o conhecimento é maior na população com nível de escolaridade mais elevado e, segundo o Boletim Epidemiológico, a população com menos escolaridade é mais acometida pela infecção.3,11
Cabe destacar, que a população com nível superior representa aproximadamente 8 % da população brasileira e, na totalidade de casos notificados, 5,2 % pertenciam a esse nível de escolaridade. Acredita-se, portanto, que a ocorrência da infecção pelo HIV está relacionada a um conjunto de fatores condicionantes e não somente às pessoas com mais ou menos anos de estudo.3 As populações menos escolarizadas, em sua maioria, vivem em situações de pobreza, em localidades com acesso a serviços públicos e infraestrutura precária, e em áreas que sofrem por violência urbana ou rural. Quanto às pessoas com nível escolar elevado, percebe-se que mesmo tendo maior conhecimento, ainda assim assumem comportamentos que as tornam vulneráveis à infecção.12
Trabalhar com a temática sexualidade, imprescindível para promover um conhecimento genuíno no campo das doenças sexualmente transmissíveis e HIV/Aids, ainda é uma dificuldade na educação escolar. Os valores, crenças, tabus, mitos e estereótipos presentes em nossa sociedade, remetem a sexualidade à percepção da obscenidade, do pecaminoso e proibido, negando-se aos jovens a educação sexual e dificultando à prática de educação em saúde as pessoas.13
Com relação ao estado conjugal a maioria possui companheiro. A crença na fidelidade oriunda dos relacionamentos estáveis (amor, romantismo, tempo e confiança), cria a sensação de proteção contra a infecção pelo vírus, tendo como consequência o abandono no uso do preservativo.12 Estabelecer o uso do preservativo em relacionamentos estáveis provoca desconfiança entre o casal, e até mesmo a ideia de tentar negocia-lo não é bem aceita por colocar em choque os princípios de amor e fidelidade. Mesmo entre jovens, que nasceram e iniciaram sua vida sexual no advento da epidemia de Aids, o preservativo é utilizado apenas nas primeiras relações sexuais, sendo dispensado quando se estabelece a confiança mútua. Entende-se que o uso do preservativo nem sempre estará associado com nível de conhecimento da população, mas com aspectos sociais e culturais que conduzem nossa sociedade. 14
Conhecimento quanto às formas de transmissão e prevenção
ao HIV/Aids
Observa-se que a população estudada possui bom nível de conhecimento em relação ao sangue. Quanto ao esperma e secreções vaginais, esses valores um pouco abaixo do esperado podem estar associados à dificuldade de compreender que esses fluidos corporais estão vinculados à transmissão sexual, já que a maioria dos entrevistados reconhece que a transmissão por relação sexual anal e vaginal, sem preservativo, pode transmitir o vírus. As vias de transmissão vertical ainda divergem na opinião dos entrevistados, mesmo havendo predominância feminina. O crescente número de infecções pelo vírus HIV em mulheres trouxe como consequência um aumento nas taxas de transmissão vertical, lembrando que essa via poderia ser facilmente erradicada através de diagnóstico precoce, tratamento adequado e educação em saúde.15 O enfoque em atividades educativas para essa temática, está em consonância com as metas estabelecidas pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids para 2015, com o propósito de eliminar a transmissão vertical do HIV.16
Em estudo realizado a nível nacional, em maternidades pelo Brasil, foi constado que o grau de implementação do diagnóstico de HIV no pré-natal foi insatisfatório, e que das 324 parturientes identificadas soropositivas para HIV, 18 % não foram medicadas e 7 % não tiveram seus bebes medicados.17 Com relação ao conhecimento de gestantes que adentram no serviço de pré-natal, foi observada a carência de informação quanto à transmissão por via vertical.18 Ao provermos a educação em saúde, garantimos aos usuários o reconhecimento dos seus direitos e garantias dentro dos serviços de saúde, minimizando os erros decorrentes de situações adversas.
Segundo estudo que compara o conhecimento sobre Aids de homens idosos com adultos jovens, observa-se que os jovens possuem maior conhecimento com relação a Aids, condutas preventivas e importância do teste de HIV, mesmo com níveis de escolaridade iguais. Os idosos tem sua sexualidade negada pela sociedade, inclusive pelos profissionais de saúde, através de pensamentos estereotipados que não os reconhecem como seres desejáveis e sexualmente ativos. A ausência de ações educativas direcionadas a esta clientela provoca uma situação de vulnerabilidade à infecção, tendo em vista que o advento de relações sexuais protegidas se firma mundialmente com a pandemia causada pelo HIV.19
Contudo, os jovens também se mostram insuficientemente informados e com conhecimentos errôneos a respeito de comportamentos sexuais específicos de risco como, não saber que podem ser infectados através de relações sexuais oral/anal, que o vírus pode ser transmitido durante a gestação ou parto, que praticar coito interrompido, utilizar antibiótico e realizar uma ducha após a relação sexual seriam estratégias capazes de protegê-los da infecção.20 Com relação aos meios e modos citados pelos entrevistados, onde não há possibilidade de infecção, outro estudo confirma tais achados, apresentando o desconhecimento de jovens, quando citam, que através do compartilhamento de copos, talheres e toalhas, e através de assento de vaso sanitário, abraço, aperto de mão e beijo no rosto possa haver contaminação. Sendo os jovens do sexo masculino os que mais carecem de conhecimento sobre a temática.21
A aparência externa está deixando de ser vista como forma de avaliar se a pessoa é portadora ou não do HIV. A veiculação de grupos de risco e imagens de pessoas acometidas pelas doenças oportunistas, característica da Aids no inicio da epidemia, povoavam no imaginário social a ideia estereotipada dos acometidos pela infecção.21
Estudos internacionais corroboram tais achados, ao afirmarem que a grande maioria da população possui conhecimento mediano aos modos de transmissão da doença, reconhecendo as principais vias de transmissão (sexual e sanguínea). Contudo, ainda persistem equívocos quanto ao compartilhamento de objetos pessoais, aleitamento materno, tatuagem, picada de mosquito e beijo no rosto.22,23
Dentre os meios de informação para aquisição de conhecimento, a mídia é a mais citada pelos entrevistados, provavelmente devido a sua abrangência. Esse fato reforça a necessidade do profissional de saúde estabelecer vínculos político-sociais, para que as atividades educativas em saúde tenham espaço cada vez maior em rádios, jornais, revistas e televisão. As unidades de saúde mostram-se participativas na prestação de informações quanto à temática, contudo a visão moral de alguns profissionais com relação à sexualidade impede, muitas vezes, de prover ações educativas adequadas.19
Em relação à internet temos um contraponto por tratar-se de um meio onde as informações inverídicas também circulam, entretanto os serviços de saúde podem utilizar melhor essa ferramenta para desenvolver atividades educativas. Apesar do nível de escolaridade estar intimamente relacionado ao melhor conhecimento sobre o vírus e seus modos de transmissão e prevenção, infelizmente a escola ainda é pouco mencionada na prestação de informações sobre a temática, podendo ser explicado pela predominância de sujeitos nascidos antes da descoberta do vírus ou pela dificuldade de adentrar em um campo que está intimamente ligado a sexualidade humana. 19
Estudos retratam que o nível de escolaridade nem sempre estará associado ao conhecimento sobre HIV/Aids, sendo necessárias ações que promovam mudanças na formação cultural e social, principalmente durante o período de desenvolvimento infanto-juvenil nas escolas. 24,25 Cabe também, não designar única e exclusivamente aos pais a tarefa de prover os ensinamentos sobre corpo, sexo e sexualidade, devendo estas informações serem prestadas por profissionais com exímia competência e habilidade sobre o assunto, evitando deste modo a prestação de informações dúbias.
O uso do preservativo
Apesar de a camisinha aparecer como o recurso para a prevenção ao HIV/Aids mais citado pelos entrevistados, poucos são os que sempre fazem uso deste método. Em estudo realizado no Rio de Janeiro, a principal variável associada à presença de doenças sexualmente transmissíveis foi o uso infrequente do preservativo.26 O fato de o preservativo ser mais utilizado com parcerias casuais é abordado em estudo que justifica seu uso na percepção individual de vulnerabilidade, visto que se trata de uma relação onde não foi estabelecido um vínculo de confiança, ou onde até há esse vínculo, no entanto seu uso, também, está associado à ideia de contracepção.19
Nas relações estáveis o preservativo muitas vezes é abandonado pela crença ilusória na imunidade relacionada ao afeto e amor, como se estes sentimentos garantissem a proteção adequada à infecção. Há também subalternidade da mulher ao homem em algumas culturas, onde a mulher torna-se obrigada a aceitar as vontades de seu companheiro.20
O preservativo masculino, mais comum no Brasil, provoca uma dicotomia de poder entre homem e mulher, onde a mulher perde a capacidade de decidir sobre seu próprio corpo e executar seu protagonismo, cabendo ao homem a decisão sobre que rumo será realizada a relação sexual.21
Outros fatores que também podem influenciar o uso do preservativo é a crença de que a Aids é uma doença do “outro”, que a camisinha diminui o prazer e prejudica a ereção, e que propor sua utilização em relacionamentos estáveis pode ser motivo de desconfiança entre o casal.19,20
Podemos concluir que, apesar dos avanços ao longo desses 30 anos de epidemia, os participantes do carnaval carioca ainda possuem dúvidas e equívocos quanto aos modos de transmissão da patologia, principalmente na temática da transmissão vertical. É considerável, também, o percentual de pessoas que não adotam práticas de sexo seguro com uso do preservativo, inclusive nos relacionamentos não estáveis. O fato de existirem dúvidas que ainda permeiam o conhecimento popular pode ser considerado um fator que promova o preconceito e a discriminação aos portadores do HIV/Aids.
O desenvolvimento deste projeto no carnaval carioca contribui para sensibilizar a comunidade e a mídia, considerando a visibilidade do evento para o país. Estudo realizado na África do Sul constatou que os veículos de comunicação de massa estão associados na disseminação do conhecimento, proporcionando mudanças comportamentais e sociais, colaborando na maior adesão ao uso do preservativo, ao teste para diagnóstico de HIV e atitudes menos estigmatizantes aos portadores do vírus.27
A importância da continuidade de ações educativas e de conscientização para a problemática do HIV/Aids se sustenta, considerando que a doença representa um importante agravo de saúde pública para o país. A enfermagem tem um compromisso profissional e social na manutenção e promoção da saúde da população, e as atividades educativas visam garantir que os cidadãos tenham o conhecimento necessário sobre as medidas preventivas e a necessidade de incluí-las em suas vidas. A educação em saúde desenvolvida em projetos na comunidade tem efeito multiplicador e disseminador de conhecimentos e contribuem para o esclarecimento da população acerca do HIV/Aids.
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Disponível em: www.hindawi.com/journals/tswj/2012/384608/.
Doi:10.1100/2012/384608.
Recibido: 8 de agosto de 2013.
Aprobado: 9 de mayo de 2014.
Márcio Tadeu Ribeiro Francisco . Doutor em Saúde Coletiva. Professor Adjunto da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Coordenador do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Veiga de Almeida. Coordenador executivo do Projeto de extensão “Só a alegria vai Contagiar! O samba da prevenção vai pegar neste carnaval!”. Endereço: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Centro Biomédico, Departamento de Fundamentos de Enfermagem. Boulevard, 28 de setembro, 157 - Vila Isabel. CEP: 20550031 - Rio de Janeiro, RJ – Brasil. Telefone: 55 21 25876335. E-mail: mtadeu@uva.br
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