Vulnerabilidades de pescadores de comunidades ribeirinhas às Infecções Sexualmente Transmissíveis

ARTÍCULO ORIGINAL

 

Vulnerabilidades de pescadores de comunidades ribeirinhas às Infecções Sexualmente Transmissíveis

 

Vulnerabilidad de los pescadores de las comunidades costeras a las infecciones de transmisión sexual

 

Vulnerability of fishermen from coastal communities to sexually transmitted infections

 

 

Luciano Luz Ribeiro, Wanderson Carneiro Moreira, Ana Raquel Batista de Carvalho, Maria da Consolação Pitanga de Sousa, Moisés Lopes Carvalho, Tânia Maria Basílio Quezado de Castro

Centro Universitário UNINOVAFAPI. Teresina (PI), Brasil.

 

 


RESUMO

Introdução: As Infecções Sexualmente Transmissíveis, especificamente a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida são patologias que representam grandes desafios para a saúde no contexto mundial, merecendo destaque devido ao seu alto potencial de disseminação. No universo masculino, verifica-se que vem se intensificando o aumento da incidência dessas patologias, sobretudo nos grupos representados pelos adolescentes e jovens.
Objetivo: Analisar as vulnerabilidades de pescadores de comunidades ribeirinhas às infecções sexualmente transmissíveis.
Métodos: Trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva de abordagem qualitativa, realizada nas comunidades ribeirinhas do interior piauiense, Brasil. A amostra foi composta por 18 homens que vivem nessas comunidades.
Resultados: Os resultados foram divididos em duas categorias, a saber: Vulnerabilidades de pescadores relacionadas as infecções sexualmente transmissíveis e práticas preventivas; Políticas públicas de saúde voltadas para a saúde sexual dos homens. Percebeu-se que há uma grande deficiência de conhecimento dos pescadores sobre essas infecções, devido ao baixo grau de escolaridade e a ausência de ações educativas em saúde por parte da Estratégia de Saúde da Família, o que os torna muito vulneráveis às Infecções Sexualmente Transmissíveis.
Conclusão: Há uma necessidade de realizar ações educativas em saúde para os pescadores, por parte da Estratégia Saúde da Família, visto que as políticas de saúde para os homens contemplam ações para as populações mais vulneráveis.

Palavas chave: Saúde do homem; sexualidade; HIV; infecções sexualmente transmissíveis; direito à saúde.


RESUMEN

Introducción: las infecciones de transmisión sexual son enfermedades que constituyen importantes desafíos para la salud en el contexto global, y el síndrome de inmunodeficiencia adquirida merece una mención especial debido a su alto potencial de propagación. En el universo masculino, parece que se está intensificando la creciente incidencia de estas enfermedades, especialmente en los grupos representados por adolescentes y jóvenes.
Objetivo: analizar las vulnerabilidades de pescadores de comunidades ribereñas con las infecciones de transmisión sexual.
Métodos: estudio con enfoque cualitativo, exploratorio y descriptivo, llevado a cabo en las comunidades ribereñas de Piauí interior. La muestra consistió en 18 hombres que viven en estas comunidades.
Resultados: se dividieron en dos categorías, a saber: los pescadores de vulnerabilidad relacionados con las prácticas de prevención de infecciones y las políticas públicas de salud centrados en la salud sexual de los hombres de transmisión sexual. Se observó que existe deficiencia de los conocimientos de los pescadores sobre estas infecciones, debido al bajo nivel de educación y la falta de las acciones en salud en la Estrategia Salud de la Familia, que los hace muy vulnerables a las infecciones de transmisión sexual. Conclusión: se necesitan actividades de educación en la salud de los pescadores, mediante la estrategia de salud de la familia, como las políticas de salud para los hombres que incluyen acciones para las poblaciones más vulnerables.

Palabras clave: salud del Hombre; sexualidad; VIH; enfermedades de transmisión sexual; derecho a la salud.


ABSTRACT

Introduction: Sexually transmitted infections, specifically the acquired immunodeficiency syndrome are diseases that pose major challenges for health in the global context deserves special mention because of its high potential for spread. In the male universe, it appears that is intensifying the increasing incidence of these diseases, especially in the groups represented by adolescents and youth.
Objective: Analyze the fishing vulnerabilities related to sexuality and sexually transmitted infections prevention practices.
Methods: This is an exploratory and descriptive qualitative approach, carried out in the riverine communities of Piaui interior. The sample consisted of 18 men who live in these communities.
Results: The results were divided into two categories, namely: Vulnerability fishermen related and prevention practices Sexually Transmitted Infections; health public policies focused on the sexual health of men. It was noticed that there is a big fishermen's knowledge deficiency on these infections, due to the low level of education and lack of educative health actions by the Family Health Strategy, which makes them very vulnerable to sexually transmitted infections.
Conclusion: There is a need for educational activities in health for fishermen, by the Family Health Strategy, as health policies for men include actions for the most vulnerable populations.

Keywords: Men's Health; sexuality; HIV; sexually transmitted diseases; right to health.


 

INTRODUÇÃO

As discussões em relação à saúde do homem ampliou-se significativamente nas últimas décadas, devido às particularidades relacionadas a essa população. Estudiosos da área ressaltam que é de extrema importância a elaboração de novas pesquisas e a difusão do conhecimento sobre a saúde do homem, de modo a lançar novos olhares sobre as masculinidades e sua relação com o processo saúde/doença.1

Os dados de mortalidade no Brasil revelam que os homens morrem mais precocemente do que as mulheres. A mortalidade por faixa etária que apresenta maior índice é de 20 a 39 anos. Entre a faixa de 15 a 44 anos o percentual de homens é 23,2, enquanto no sexo feminino é de 11,0%. Estes dados revelam que os homens estão morrendo mais nas fases da vida jovem e adulto.2

Nos Estados Unidos, Centros de Controle de Doenças e as estatísticas de Prevenção apontam um índice de mortes masculinas de 886.2 por 100.000 habitantes versus 634,3 mortes de mulheres por 100.000 habitantes e uma expectativa de vida para os homens de 76,2 anos, enquanto que a estimativa de vida feminina é de 81,1 anos. Os fatores que mais predispõe esse evento são estilo de vida do sexo masculino, aumento de comportamentos de risco e susceptibilidade às doenças.3

No que se refere à morbidade entre os homens, as principais causas são as doenças do aparelho circulatório, infecciosas e parasitárias, do aparelho digestivo e lesões. Quanto às causas por lesões e envenenamento como causa de internação, os homens superam o número de internações comparando com as mulheres. No que tange à relação entre violência e comprometimento da saúde, os homens adultos sofrem mais violência física, e se envolvem mais na violência relacionada ao trabalho e ao crime.2

Quanto as Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), especificamente a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) são patologias que representam grandes desafios para a saúde no contexto mundial, merecendo destaque devido ao seu alto potencial de disseminação.4 No universo masculino, verifica-se que vem se intensificando o aumento da incidência de HIV/Aids, sobretudo nos grupos representados pelos adolescentes e jovens.5

A literatura ancora-se na premissa de que as construções socioculturais da masculinidade hegemônica contribuem na forma como estes atribuem sentidos à prevenção as IST. Isto é, como os homens são ensinados para demonstrarem ser mais forte que as mulheres, sobretudo, em relação à saúde, estes não se consideram vulneráveis as doenças, por exemplo, à infecção pelo HIV/Aids.6,7

Estudos estimam que 20 milhões de novos casos de IST ocorrem anualmente nos Estados Unidos com um custo total de 16 bilhões para tratamento e cuidados dos mesmos. Globalmente, IST tratáveis são responsáveis por aproximadamente 500 milhões de novos casos por ano. Atualmente existem 35 milhões de pessoas vivendo com o HIV no mundo.7

No Brasil, entre os anos de 1980 a 2015 foram notificados 798 333 casos de Aids, sendo 519 183 em homens. No Nordeste esse número atingiu 116 769 e no Piauí 6 004 casos de Aids notificados na população. 5 Quanto a estimativa de custo com pacientes no Brasil, estudo realizado em um município do Norte brasileiro identificou que o tratamento de um portador de HIV/Aids em 2008 teve um custo de R$ 1 757,23 por paciente, e em 2009 R$ 1 602,45.8

Os primeiros casos de Aids no Brasil, surgiram nos anos 80 entre os denominados grupos de risco, os quais incluíam os homossexuais do sexo masculino, os usuários de drogas injetáveis e as prostitutas. Posteriormente, essa denominação foi substituída pela expressão comportamento de risco, por estar associada à exposição ao risco de contaminação pelo HIV entre pessoas que praticavam o sexo sem uso de preservativo, ou ainda compartilhando seringas durante o uso de drogas injetáveis, dentre outros, tendo como suporte a decisão individual à exposição. A mudança do perfil epidemiológico da Aids, nos anos 90, ampliou o universo de pessoas infectadas pelo vírus HIV entre heterossexuais, homossexuais e bissexuais.9

Assim é pertinente compreender as dinâmicas que impulsionam e sustentam a transmissão de IST, considerando que apesar da alta incidência destas, e por estar entre as principais causas da procura nos serviços de saúde pela população, não há uma exatidão de registro epidemiológico.

Somente as doenças como Aids, sífilis congênita, sífilis em gestante e a adquirida, além do HIV em gestante e crianças expostas a transmissão vertical ao HIV, e ainda a síndrome do corrimento uretral masculino, são de notificação compulsória.10

Diante do exposto, este estudo teve como objetivos analisar as vulnerabilidades de pescadores de comunidades ribeirinhos as IST, bem como descrever as práticas preventivas as IST utilizadas.

 

MÉTODOS

Estudo exploratório e descritivo de abordagem qualitativa realizado nas comunidades ribeirinhas do interior do Piauí, Brasil. Considerando que a atividade pesqueira movimenta a economia local nas comunidades ribeirinhas no interior do Piauí, atividade praticada por muitos moradores, optou-se em investigar os Pescadores ribeirinhos sobre a sua saúde sexual.

Considerou-se critérios de inclusão neste estudo, ser pescador do sexo masculino, cadastrado na Colônia Sindical de Pescadores de um município localizado na região nordeste do Brasil. As Colônias Sindicais de Pescadores, foram instituídas com a Constituição Federal brasileira de 1988, a qual estabeleceu o processo de redemocratização, sobretudo, no âmbito dos direitos trabalhistas, consolidando assim a liberdade sindical das categorias trabalhadoras e patronais.11

Outro critério de inclusão dos participantes foi de exercer­­­ a atividade de pescador a pelo menos um ano, está na faixa etária entre 19 a 59 anos e que não tinham nenhuma deficiência visual ou auditiva. Para os critérios de exclusão, foram considerados os trabalhadores não localizados no momento da coleta de dados e os que não aceitaram participar do estudo.

Para a autorização do estudo, os pesquisadores se reuniram com a presidenta da Colônia Sindical, a fim de explicar sobre o estudo e solicitar a autorização. Posteriormente, foi realizado o primeiro contato com o grupo de pescadores na própria sede da Colônia Sindical, com os pesquisadores. Neste momento, foi informado sobre os objetivos do estudo, bem como a importância deste para ampliar as estratégias de saúde para a prevenção das IST. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A coleta foi realizada em janeiro de 2015.

No segundo momento foi realizada a coleta de dados pelos pesquisadores, por meio da técnica de grupo focal, com dinâmicas de grupo, a qual possibilitou discutir temas relacionados à: sexualidade; vulnerabilidade; conhecimento sobre as IST/HIV/Aids e as formas de prevenção. Também foi utilizado um formulário contendo dados para caracterização dos participantes. A escolha da técnica de grupo focal pelos pesquisadores se deu em função de que consiste numa técnica de inegável importância para se tratar das questões de saúde sob o ângulo do social, ao estudo de representações e relações dos diferenciados grupos de profissionais da área, dos vários processos de trabalho e também da população.12

Outro aspecto que também foi considerado para escolha desta técnica, foi devido ao baixo nível de escolaridade dos pescadores. Neste contexto, o grupo focal

possibilitou a participação dos pescadores nas dinâmicas, por abordar os temas por meio da linguagem não escrita, ou seja, cada tema introduzido foi solicitado aos pescadores para expor as ideias em painéis confeccionados com papel madeira, com desenhos, pinturas, recorte e colagem.

O grupo focal foi conduzido pelos pesquisadores, e houve a participação de 18 pescadores. Desta forma, o grupo focal foi realizado em três etapas: na primeira, foi abordado sobre a sexualidade e o conhecimento dos pescadores sobre as IST; na segunda sobre a vulnerabilidade destes as IST; na terceira sobre as formas de prevenção as IST.

Além do registro das dinâmicas em painéis com papel madeira, confeccionados pelos próprios pescadores, houve o registro fotográfico durante a realização das dinâmicas, bem como da gravação do áudio das falas dos pescadores, durante a apresentação dos painéis. O registro fotográfico e do áudio, foi escolhido pelos pesquisadores, visto que estes possibilitam, maior estratégia de comprovação fidedigna das discussões.

Os dados foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo, por ser um conjunto de técnicas de análise das comunicações.13 Assim os resultados são apresentados da seguinte forma: caracterização dos participantes; conhecimento sobre as IST/HIV/Aids; prevenção; sintomas e cuidados. Nos resultados estão expostas as informações dos pescadores de acordo com os painés que eles confeccionaram sobre cada tema abordado no grupo focal.

Após os resultados, a discussão dos dados está apresentada em duas categorias temáticas, a saber: Vulnerabilidades de pescadores as IST e práticas de preventivas; Políticas públicas de saúde voltadas para a saúde sexual dos homens. Essas categorias emergiram a partir das discussões no grupo focal, visto que deixaram lacunas acerca das temáticas.

Visando cumprir com o direito do anonimato dos participantes, estabelecidos pela Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, as falas dos participantes durante a apresentação dos painéis no grupo focal, estão identificados pela letra g acrescida de um número arábico crescente.

A pesquisa foi aprovada pela Coordenação de Pesquisa e Mestrado Profissional em Saúde da Família do Centro Universitário UNINOVAFAPI, de acordo com o edital Nº 001/2014-2015 para seleção de projetos de iniciação científica (PIBIC/PIVIC). A coleta de dados iniciou após aprovação da Instituição Coparticipante e do Comitê de Ética e Pesquisa do Centro Universitário UNINOVAFAPI (CAEE, 38454614.3.0000.5210), atendendo todas as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.

 

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 18 pescadores entre 27 a 48 anos. Quanto ao estado civil, 16 eram casados e 2 solteiros. No que se refere ao grau de escolaridade, 16 não eram alfabetizados e dois tinham um nível de escolaridade muito baixo, apenas se restringido a escrever o nome e algumas palavras com dificuldade, demonstrando da mesma forma quanto à leitura.

Quanto a renda mensal, todos os pescadores sobrevivem da pesca, e no período da piracema, o qual ocorre em sua maioria nos meses de novembro a março, recebem o auxílio defeso no valor do salário mínimo vigente, ou seja, oitocentos e oitenta reais (R$ 880,00).

Quando abordado sobre o conhecimento acerca das IST, os pescadores demonstraram um nível de conhecimento deficiente, devido ao fato da maioria deles não ser alfabetizados, sobretudo, pela ausência do serviço público de saúde atuante, ou seja, Estratégia Saúde da Família (ESF), por não realizar atividades educativas em saúde orientando-os sobre as IST, sobre prevenção, transmissão, tratamento, dentre outros aspectos necessários.

Estas dificuldades e limitações foi demonstrada em relação ao conhecimento sobre as IST/HIV/Aids, expostos nos painéis, por meio de expressões populares, como também de desenhos, conforme relato a seguir:

E squentamento, coceira, escorrimento (corrimento), pira (coceira) e cafubila (nome vulgar de gonorréia). G1.

Cafubila (gonorreia) significa coceira, impinja (impinge) e esquentamento. G2.

Quanto aos sintomas de algumas doenças sexualmente transmissíveis e aos cuidados em relação a estas, os pescadores evidenciaram conhecimento insuficiente, além do uso dos termos populares para se referir as doenças.

A gonoreia (gonorreia): cria pus; escorrimento (corrimento) cria infecção; micosi (micose) ou cafubila (cafubira) cria coseira (coceira) irnjaço (inchaço) fere (ferida). G1.

Quanto ao conhecimento sobre o HIV, os pecadores expressaram informações insuficientes no que se refere ao vírus HIV, como também em relação as formas de transmissão, conforme relatado a seguir. Entretanto, verifica-se que eles ressaltaram sobre a importância da prevenção.

O HIV é uma doença muito grave que está "afetando a nossa população" porque os jovens estão fazendo relações sem proteção, pro exemplo (por exemplo), um beijo, um sexo oral. Pro exemplo (por exemplo), um aperto de mão, um abraço, um copo bibida (copo de bebida). G3.

Em relação à vulnerabilidade dos pescadores as IST, foram demonstradas nos painéis que a falta de prevenção, pode levar ao aumento da vulnerabilidade destes as IST. O painel que mais ressaltou sobre a importância da prevenção, foi sobre a história de Maria e João, criado por estes para explicar sobre as relações sexuais sem o uso do preservativo.

Maria é esposa de João. João está com o viru (virus) HIV. Ele pegou o viru (virus) com uma relação sem prevenção, fora do casamento. Mesmo com o viros (virus), continuou tranzando (transando) com sua esposa e ela se contaminou com a mesma doença. G4.

Quanto às formas de prevenção apontadas pelos pescadores, somente o uso de preservativo foi mencionado, durante as discussões. Ou seja, nenhuma das outras formas de prevenção, como o uso de seringa individual e descartável, não amamentação de crianças filhas de mães HIV+, não compartilhamento de instrumentos perfuro cortantes, foram expostos, devido a falta de informação que os pescadores têm em relação as IST/HIV/Aids.

Então, como previni (previnir) após as relações: primeiro, lavar bem lavado com sabão e bem água. Segundo, procurar sempre orientação medica (médica) fazendo consulta periodicamente. [...] G2.

Se você procurar uma aventura fora, previna-se! G4

Usando camisinha. G1.

Se você não quiser pegar a doença (IST), vai pescar. G3.

 

Os discursos demonstram limitações quanto ao conhecimento sobre as formas de prevenção as IST. Desta forma, pode-se apontar que os pescadores encontram-se vulneráveis as IST, e que há a necessidade de ações educativas em saúde voltada para essa população masculina.

 

DISCUSSÃO

Neste capítulo é apresentada a discussão dos resultados obtidos, a partir do instrumental utilizado para a coleta dos dados, grupo focal, o qual foi realizado por meio de dinâmicas de grupo com os pescadores. Os resultados foram analisados a luz do referencial teórico acerca da vulnerabilidade dos pescadores às IST, bem como das políticas de saúde pública, Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), e ESF. A discussão está dividida em duas categorias temáticas, a saber: Vulnerabilidades de pescadores relacionadas às IST e práticas preventivas; Políticas públicas de saúde voltadas para a saúde sexual dos homens.

Vulnerabilidades de pescadores relacionadas as IST e práticas preventivas

Nas discussões durante o grupo focal ficou evidente o baixo nível de conhecimento dos pescadores sobre as IST, no que se referem ao conceito, formas de transmissão e prevenção. Os participantes demonstraram conhecer apenas algumas IST, pelos nomes populares. Em nenhum momento foi citado nomes técnicos e/ou científico destas. Quanto às formas de transmissão, foi revelada apenas a transmissão pelo sexo, sendo desconsideradas as outras formas como, uso compartilhado de drogas injetável e objetos perfuro cortante, transmissão vertical do HIV, bem como através do leite materno de mãe HIV+.

Deve-se ressaltar que é bastante preocupante, quando os pescadores demonstraram o beijo e o aperto de mão, como formas de transmissão do HIV. Isto posto, verifica-se que o baixo nível de conhecimento sobre as IST, pode elevar a vulnerabilidade dos pescadores as IST devido à falta de informação.

O termo vulnerabilidade no contexto da saúde foi introduzido por Mann14 que o definem como a chance de exposição do ser humano ao adoecimento como consequência de um amontoado de aspectos não só individuais, mas também coletivos, contextuais, que acarretam maior suscetibilidade à infecção e ao adoecimento. Ressalta ainda que as pessoas são vulneráveis à infecção pelo HIV quando se expõe ao vírus pela relação sexual, ou fluidos corporais como sangue contaminado. Além da vulnerabilidade biológica, existe uma realidade epidemiológica que tem que ser levada em consideração, de que o HIV necessita de ações e/ou comportamentos específicos e identificáveis para que ocorra uma transmissão.

A vulnerabilidade está relacionada a três âmbitos: a individual, a social e a programática. A vulnerabilidade individual associa-se a qualidade da informação que as pessoas dispõem sobre Aids, suas formas de transmissão são: sexuais, uso de drogas, sobretudo quanto a capacidade de incorporar estas informações e colocá-las no seu cotidiano, no que se refere às práticas preventivas. A social está relacionada ao acesso as informações, o acesso aos serviços de saúde e educação, político e jurídico, as questões de gênero, sexualidade, dentre outras que possibilitam romper com o processo de vulnerabilidade a Aids. A vulnerabilidade programática está relacionada à capacidade das instituições como família, escola, serviços de saúde, com políticas efetivas para o controle e prevenção das IST, especificamente a Aids.15

No tocante a vulnerabilidade individual dos pescadores, ficou evidente que estão muitos vulneráveis, em função do baixo nível de informação sobre as IST, sobretudo, quanto às formas de transmissão e prevenção, conforme demonstrado no grupo focal. Isto mostra que esta deficiência de informações, dificulta a incorporação de práticas preventivas as IST.

Outro aspecto que se deve ressaltar é que os pescadores também encontram-se vulneráveis socialmente, devido ­à ausência do poder público de saúde, em relação às ações educativas em saúde para a prevenção das IST, por não ter acesso as informações sobre as IST, além da não acessibilidade aos serviços de saúde, especialmente pela ESF, que é responsável pela atenção básica de saúde, no contexto da promoção da saúde e prevenção de doenças. Esta deficiência de acesso as ações de saúde, realizada pela ESF, contribui para o não rompimento com o processo de vulnerabilidade as IST, em última instância, da Aids.16

A vulnerabilidade individual dos homens se dá em diversas áreas. Uma delas se trata da resistência ao uso do preservativo, dificultando as ações de prevenção as IST, levando a vulnerabilidade social, visto que é necessário o instrumento de prevenção (preservativo), conjuntamente com a informação ao público masculino. Há que considerar ainda vários outros aspectos relacionados à vulnerabilidade dos homens as IST, especialmente quanto ao HIV/Aids, tais como: a forma como essa informação chega aos indivíduos, em que linguagem e se suas expectativas são consideradas. Neste sentido, as estratégias de prevenção precisam contribuir para uma reflexão acerca de como são experienciadas diariamente as informações sobre o HIV/Aids.1

A vulnerabilidade programática, está relacionada à capacidade das instituições como família, escola, serviços de saúde, em atuar com políticas efetivas para o controle e prevenção das IST, especificamente a Aids e implantar ações de forma adequadamente para atender as necessidades da população.15 Nos relatos, ficou evidente que há uma deficiência na atuação dessas instituições, quanto as políticas de controle e prevenção as IST, levando também os pescadores a vulnerabilidade programática.

É importante apontar que a vulnerabilidade masculina se torna muito mais elevada quando equiparada a feminina, principalmente devido a lacunas no que diz respeito à adoção de medidas de prevenção pelo homem.17

Políticas públicas de saúde voltadas para a saúde sexual dos homens

O que se verificou nesta pesquisa é que há uma grande deficiência nas ações de saúde voltadas para a população ribeirinha, embora desde de 2008 tenha sido implantada a PNAISH,18 ainda existem lacunas na implementação dessa política, principalmente em relação a saúde sexual dos homens. A problemática relacionada às vulnerabilidades dos homens as IST se torna ainda mais complexa, devido a fatores socioculturais, referentes à construção da subjetividade masculina, inerente a representação social do papel do ser homem na sociedade moderna, com raízes profundas na sociedade patriarcal, machista, favorecendo para as desigualdades dos gêneros.19

Desta forma, esse papel do masculino educado para ser forte, não demonstrando dor, sentimentos, anseios, desejos, desfavorece o homem, e o faz afastar da sua responsabilidade de cuidar de si, sobretudo da sua saúde. As políticas de saúde foram estruturadas nesse modelo de sociedade patriarcal, a qual a mulher por ser considerada mais frágil e consequentemente adoecer mais, procura mais os serviços de saúde.20,21

Neste sentido, o homem também perde em relação ao seu atendimento nos serviços de saúde, por não ter serviços específicos na rede pública para eles, os maiores atendimentos nos serviços de saúde ocorrem principalmente por meio do atendimento de média e alta complexidade, muitas vezes esses pacientes chegam ao serviço em estágio avançado da doença e muitas vezes sem cura, ocasionando demanda de custo para o sistema de saúde.22

Além disso, a organização dos serviços públicos de saúde ainda é tímida no que se refere a implementação da PNAISH no âmbito da ESF, necessitando de reflexões e problematizações que contribuam para a criação de mecanismos para a melhoria da atenção dispensada a população. O contexto vivido pelos usuários dos serviços de saúde é um indicador importante para nortear as ações e apontar as condições e possibilidades de mudanças culturais.23

Para que haja de fato a procura dos homens aos serviços de saúde, além da desconstrução da identidade masculina da sociedade patriarcal, é preciso que a rede de serviços, pública e privada de saúde, sejam reorganizadas, considerando as especialidades médicas para o público masculino, além de horários mais flexíveis para que estes tenham seu direito à saúde integral e de forma equitativa garantida.

Foi a partir de toda esta problemática levantada que o Ministério da Saúde brasileiro implantou desde 2008 a PNAISH. Um dos principais objetivos da referida política é promover ações de saúde que contribuam significativamente para a compreensão da realidade singular masculina nos seus diversos contextos socioculturais e político-econômicos e que, respeitando os diferentes níveis de desenvolvimento e organização dos sistemas locais de saúde e tipos de gestão, possibilitem o aumento da expectativa de vida e a redução dos índices de morbimortalidade por causas que podem ser prevenidas nessa população.17

A PNAISH está alinhada com a Política Nacional de Atenção Básica, porta de entrada do Sistema Único de Saúde, com as estratégias de humanização em saúde, e em consonância com os princípios do Sistema Único de Saúde, fortalecendo ações e serviços em redes e cuidados da saúde.18

A PNAISH está alinhada com a Política Nacional de Atenção Básica, porta de entrada do Sistema Único de Saúde, com as estratégias de humanização em saúde, e em consonância com os princípios do Sistema Único de Saúde, fortalecendo ações e serviços em redes e cuidados da saúde.18

A ESF é considerada uma das portas preferenciais para o sistema de saúde no país e representa um esforço para que o SUS se consolide, tornando-se mais eficiente, fortalecendo os vínculos entre serviço e população e contribuindo para a universalização do acesso e a garantia da integralidade e equidade da assistência. Desse modo, é necessário o desenvolvimento de ações que contribuam para uma compreensão da atual realidade masculina, buscando de fato a implementação efetiva dessas ações respeitando as diretrizes da PNAISH.

Em conclusão, a pesquisa possibilitou a análise das vulnerabilidades relacionadas a saúde sexual dos Pescadores ribeirinhos, especificamente sobre as IST/HIV/Aids e suas práticas. Entretanto, percebeu-se que há grande deficiência de conhecimento dos pescadores sobre as IST, tornando-os mais vulneráveis no âmbito individual, social e programático, devido ao baixo grau de escolaridade dos pescadores, e também quanto a ausência de ações educativas em saúde por parte da ESF.

Esta pesquisa trouxe contribuições relevantes a população estudada por revelar a invisibilidade de políticas públicas que atendam as demandas de saúde reprodutiva e sexual desses pescadores. Sugere-se o desenvolvimento de novos estudos sobre a saúde do homem ribeirinho a fim de contribuir para um melhor conhecimento dessa realidade.

 

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Recibido: 2016-03-22
Aprobado: 2016-05-12

 

 

Wanderson Carneiro Moreira. Rua Vitorino O Fernandes, 6340, CEP. 64073-505, Uruguai, Teresina, Piauí, Brasil. 086998328592. Dirección electrónica: wandersonm.wm@gmail.com

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